domingo, 7 de julho de 2013

A Aventura Surrealista

“A Aventura Surrealista (tal como a denomina o próprio Movimento) configura-se por meio de três grandes verticalizações no plano objetivo: a da linguagem (leia-se da Poesia, por intermédio da escrita, das artes, dos objetos, etc.), a do Amor (a do Erotismo, da valoração do feminino e da mulher) e a da Natureza (entendida como o lugar entre o espírito humano e o mundo sensorial, via o chamado ‘saber tradicional’). As quais, permeadas pelo Desejo, ligando-as assim ao Ocultismo e ao princípio mágico das 'correspondências’, abrem-se para um sentido iniciático de apreensão, concepção e exposição do ser, de modo abrupto, numa irrupção, conforme o indica a tradição oriental ou numa ‘iluminação’, como dizia Rimbaud.”

LIMA, Sérgio. A Aventura Surrealista. Tomo 1. Editora da Unicamp; São  Paulo: UNESP; Rio de Janeiro: Vozes, 1995. p.27

O processo de criação de Miró

“[...] agora eu trabalhava com o mínimo de controle possível – pelo menos na primeira fase, a do desenho. Guaches: em cores pastel, com contrastes muito violentos. E mesmo assim, porém, apenas o esboço geral era feito de maneira inconsciente. O resto era cuidadosamente calculado. [...] houve sempre essas três fases – primeiro, a sugestão, em geral do material; segundo, a organização consciente dessas formas; e terceiro, o enriquecimento da composição. [...] Até mesmo algumas pinceladas casuais enquanto limpo os pincéis podem sugerir o início de um quadro. A segunda fase, porém, é cuidadosamente calculada. A primeira
fase é livre, inconsciente; mas depois disso o quadro é totalmente controlado.”


CHIPP, Herschel Browning. Teorias da Arte Moderna / Herschel B. Chipp com a colaboração de Peter Selz e Joshua C. Taylor ; [tradução Waltensir Dutra ...et al.]. – 2ª ed. – São Paulo : Martins Fontes, 1996. – (Coleção a) p.440

Fenomenologia do Espírito - Hegel

“179. Para a consciência-de-si há uma outra consciência-de-si [ou seja]: ela veio para fora de si. Isso tem dupla significação: primeiro, ela se perdeu a si mesma, pois se acha numa outra essência. Segundo, com isso ela suprassumiu o Outro, pois não vê o Outro como essência, mas é a si mesma que vê no Outro.”

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Fenomenologia do Espírito. A dialética do senhor e do escravo. - in Textos Básicos de Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein / Danilo Marcondes. – 2.ed. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000. p. 124

“Segredos da Arte Mágica Surrealista - Composição surrealista escrita, ou primeiro e último esboço

Instale-se confortavelmente no lugar mais favorável à concentração de sua mente e faça com que lhe tragam material de escrita. Ponha-se no estado mais passivo ou receptível possível. Abstraia de seu gênio, de seu talento, e também do gênio e do talento dos outros. Diga a si mesmo que a literatura é um dos mais tristes caminhos que levam a tudo. Escreva rápido, sem qualquer assunto pré-concebido, rápido bastante para não reter na memória o que está escrevendo e para não se reler.
A primeira frase surgirá por si mesma, a tal ponto é verdade que, a cada segundo, ocorre uma frase estranha ao nosso pensamento consciente, que mais não quer do que se exteriorizar. É muito difícil pronunciar-se sobre o caso da frase seguinte; ao que tudo indica, ela participa, ao mesmo tempo, de nossa atividade consciente e da outra, se admitirmos que o fato de ter escrito a primeira implica um mínimo de percepção.
Isto, aliás, deve importar-lhe pouco: é nessas coisas que reside a maior parte do interesse suscitado pelo jogo surrealista. É sempre verdade que a pontuação certamente se opõe à continuidade absoluta do fluxo de que nos ocupamos, embora ela pareça tão necessária quanto a distribuição de nós numa corda em vibração. Prossiga enquanto sentir vontade de fazê-lo. Confie no caráter inesgotável do murmúrio. Se o silêncio ameaça estabelecer-se em virtude de um erro seu, minúsculo que seja – um erro, por exemplo, de desatenção –interrompa, sem hesitar, uma linha demasiado clara. Logo depois da palavra cuja origem lhe pareça suspeita escreva uma letra qualquer, a letra l, por exemplo, sempre a letra l, e traga de volta o arbitrário impondo esta letra como inicial à palavra seguinte.”

BRETON, André. Manifestos do Surrealismo / André Breton ; tradução Sergio Pachá. – Rio de Janeiro: Nau Editora, 2001. p.44

Duas

Garanto-lhes a vida eterna
Temperada com molho madeira -
Deixem no banco ao lado os olhos e as orelhas;
Já o nariz é necessário para o aprendiz
Assim como a língua é necessária para os amantes.
Imenso prazer em conhecê-los
Despeço-me com uma canção
Deixo, talvez, algumas viúvas morrendo de emoção
"I left my heart in San Francisco..."
*1930 +2010
Fixe seu olhar cortado na serração cinzenta e fria,
Despeje aquelas lágrimas que só o orvalho conhece,
Esqueça dos arredores míticos que outrora o banharam
Hoje reinicia o ciclo mãe
Doces - os enigmas e as visões
Amanhã: o Nada inverso e nu
Submerso em setores cerebrais
Seus lamentos dizem adeus
E buscam outros carnavais
E, por favor, enlace suas mãos nas minhas
Enquanto é tempo de descanso
- De descaso -
Por hora, casemo-nos
Numa igreja com cúpula napoleônica;
Depois uma cópula com coca-cola e marlboro
No final -
Hiroshima revista
Lá de cima -
E nós, cantando e dançando em ritual pagão
Comemoraremos o novo tempo -
O silêncio se esfregando em nossas mãos
Então...

Paulo de Carvalho Castro

Fadas


Vêm com passos na relva Liberdade & Serenidade de mãos enlaçadas
Cantam as quatro estações e riem como pequenas meninas ainda verdes
E Éluard pareceu-me pisar sobre suas pegadas durante a tempestade anosa
Executado Lorca a cidade chamuscou pensamentos libertinos
Tzara transava com orquídeas & girassóis nas noites amareladas
Enquanto sonhavam Os Amantes de Magritte na Bélgica marginal
Pueris vêm os sonhos! Vêem? Lúdicos como hecatombes gregas!
Liberdade & Serenidade não virão almoçar hoje, Paz adoeceu mas
Pareceu-me que as Sete Virtudes plantaram pecados na terra úmida...
Não criem expectativas, crianças, assim apareceu-me a lua ontem
Chorando com a maquiagem borrada entre um vestígio ou outro
Nuvens & Luzes dançando excitadas o Jazz da Eternidade
Pálpebras transparentes viram! Bateram palmas. Juro-lhes!

Paulo de Carvalho Castro

Su-sussurro

Grito amadorístico num teatro profissional
em favor das peles de onça selecionadas a dedos lulísticos...
Criações metafóricas e eufóricas em enodoáveis Grampos sintéticos
cheios de manchas metálicas ferrugentas...
e lá na mesa posta as Privadas se erguem
e contemplam com seus freios ABS:
silicones mumificados -
como tatuagens em traseiros enrugados de velhas metaleiras frenéticas...
Fingem das cinco tesouras não ter o corte de apenas uma sequer
enquanto figurantes passeiam dançando sapateado jazz
no fundo do palco com cenário expressionista alemão...
Fincando facadas lúdicas nos abandonados corpos de mães
que os rabos mosqueavam ao entardecer...
meio que um quadro em branco
cintilante pincel sujo de sangue
cafeína sobre tela – 14 x 30
na Índia eu seria poeta no lombo do cavalo ornamentado
cruzando silvos em alvas paisagens praianas
(uma amada chamada Ana) beijava-me no pântano
cristas fluindo eflúvios amarelos fluorescentes por fora
relentos Insones catam grão no chão – gramo!
Grifos helenísticos bebem afrodisíacos com constantes ereções
fuzilando-se em bordéis da Quinta-feira feliz feliz!
Meretriz, mais uma champanhe, please!
E o cheiro de maria-fedida empesteia o bar
... conjuguem com urgência o verbo amar...
ou julguem com destreza o ressoar do Aço
Abraços!

Paulo de Carvalho Castro

Crigo e Castime

Os Únicos amestrados e seus alados cavalos também queriam ir rindo para a
singular amplitude,
cancioneiros Achatados ameaçados de extinção e Extintores incendiários
pregavam Jesus na cruz da Luz azul -
cobalto - que chovia ao alto do Arranhado maior ao céu que nada nunca deu ao
meu mérito mesquinho.
Ah! O quanto é mítico... me ligo nisso! 220 volts revira e volta como rabo de
porca, há, não há?
Todos provando fel em conserva por milênios trapezóides na esfera que já era
assim antes de mim -
Assim - chegamos ao mimado Fim estrelado por atores menores que fingem e
que entendem descaradamente;
há Nada que os entediem! Não é, Noé?
Grilos amigos sim! Micos gorilas não! Tudo semeará sêmen e por que não?
será uma explosão pictórica! Vista da janela da cobertura;
Culpados da abertura: Prontifiquem-se...
Mas não é que Moisés diz que não foi ele...

Paulo de Carvalho Castro

Surrealismo

A palavra Surrealismo foi criada pelo poeta Guillaume Apollinaire em 1917, para identificar novas formas de expressão artística. Foi adotada por André Breton para o movimento, por significar a idéia da existência de algo além da realidade percebida.
No Manifesto do Surrealismo, Breton define o surrealismo como:

”SURREALISMO, s.m. Automatismo psíquico em estado puro mediante o qual se propõe exprimir, seja verbalmente, por escrito ou por qualquer outro meio, o funcionamento do pensamento. Ditado do pensamento, suspenso o controle exercido pela razão, alheio a qualquer preocupação estética ou moral. ENCICLOPÉDIA, Filosofia. O Surrealismo baseia-se na crença na realidade superior de certas formas de associação até aqui negligenciadas, na onipotência do sonho, no jogo desinteressado do pensamento. Ele tende a arruinar definitivamente todos os outros mecanismos psíquicos, e a substituí-los na resolução dos principais problemas da existência. Fizeram ato de SURREALISMO ABSOLUTO os Senhores Aragon, Baron, Boiffard, Breton, Carrive, Crevel, Delteil, Desnos, Eluard, Gerard, Limbour, Malkine, Morise, Naville, Noll, Péret, Picon, Soupault, Vitrac. [...] As NOITES de Young são surrealistas do começo ao fim; infelizmente é um padre que fala, um mau padre, sem dúvida, mas um padre. Swift é surrealista na maldade. Sade é surrealista no sadismo. Chateaubriand é surrealista no exotismo. Constant é surrealista em política. Hugo é surrealista quando não é tolo. Desbordes-Valmore é surrealista no amor. Bertrand é surrealista no passado. Rabbe é surrealista na morte. Poe é surrealista na aventura. Baudelaire é surrealista na moral. Rimbaud é surrealista em seu modo de vida e em outras coisas. Mallarmé é surrealista na confidência. Jarry é surrealista no absinto. Nouveau é surrealista no beijo. Saint-Pol-Roux é surrealista no símbolo. Fargue é surrealista na atmosfera. Vaché é surrealista em mim. Reverdy é surrealista em casa. Saint-John Perse é surrealista à distância. Roussel é surrealista na anedota. Etc.”

BRETON, André. Manifestos do Surrealismo / André Breton ; tradução Sergio Pachá. – Rio de Janeiro: Nau Editora, 2001. p.40

Surrealismo (no dicionário eletrônico Aurélio de Língua Portuguesa):

“Surrealismo = Moderna escola de literatura e arte iniciada em 1924 por André Breton (1896-1966), escritor francês, caracterizada pelo desprezo das construções refletidas ou dos encadeamentos lógicos e pela ativação sistemática do inconsciente e do irracional, do sonho e dos estados mórbidos, valendo-se freqüentemente da psicanálise. Visava, em última instância, a renovação total dos valores artísticos, morais, políticos e filosóficos.
[São preferíveis, porém p. us., as formas super-realismo e supra-realismo.]”
Sendo que do prefixo podemos dizer: sur (do francês) = sobre, em, em direção a, com.


FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Eletrônico –
Século XXI. Editora Nova Fronteira, 1999.

Inconsciente, criação artística e surrealismo

Segundo Freud¹, o inconsciente mantém um papel importante na criação artística, porém, é impossível capturá-lo de maneira pura, como almejavam os primeiros surrealistas (no Manifesto do Surrealismo de A. Breton). Existiriam dois processos inconscientes, sendo que apenas um deles conseguiria chegar ao consciente, ou seja, ser expresso; ainda assim, sofrendo alterações relevantes, para os fins puristas dos surrealistas utópicos.
“Nas palavras de Lipps [1897, 146 e segs.], deve-se pressupor que o inconsciente é a base geral da vida psíquica. O inconsciente é a esfera mais ampla, que inclui em si a esfera menor do consciente. Tudo o que é consciente tem um estágio preliminar inconsciente, ao passo que aquilo que é inconsciente pode permanecer nesse estágio e, não obstante, reclamar que lhe seja atribuído o valor pleno de um processo psíquico. O inconsciente é a verdadeira realidade psíquica; em sua natureza mais íntima, ele nos é tão desconhecido quanto a realidade do mundo externo, e é tão incompletamente apresentado pelos dados da consciência quanto o é o mundo externo pelas comunicações de nossos órgãos sensoriais. [...] É provável que também nos inclinemos muito a superestimar o caráter consciente da produção intelectual e artística. As comunicações que nos foram fornecidas por alguns dos homens mais altamente produtivos, como Goethe e Helmholtz, mostram, antes, que o que há de essencial e novo em suas criações lhes veio sem premeditação e como um todo quase pronto. Não há nada de estranho que, em outros casos em que se fez necessária uma
concentração de todas as faculdades intelectuais, a atividade consciente também tenha contribuído com sua parcela. Mas é privilégio muito abusado a atividade consciente, sempre que tem alguma participação, ocultar de nós todas as demais atividades. [...] Portanto, há dois tipos de inconsciente, que ainda não foram distinguidos pelos psicólogos. Ambos são inconscientes no sentido empregado pela psicologia, mas, em nosso sentido, um deles, que denominamos de Ics., é também inadmissível à consciência, enquanto ao outro
chamamos Pcs., porque suas excitações — depois de observarem certas regras, é verdade, e talvez apenas depois de passarem por uma nova censura, embora mesmo assim, sem consideração pelo Ics. — conseguem alcançar a consciência. O fato de, para chegarem à consciência, as excitações terem de atravessar uma seqüência fixa ou uma hierarquia de instâncias (o que nos é revelado pelas modificações nelas efetuadas pela censura) permiti-nos construir uma analogia espacial. Descrevemos as relações dos dois sistemas entre si e com a consciência dizendo que o sistema Pcs. situa-se como uma tela entre o sistema Ics. e a consciência. O sistema Pcs. não apenas barra o acesso à consciência, mas também controla o acesso ao poder da motilidade voluntária e tem a seu dispor, para distribuição, uma energia de catexia móvel, parte da qual nos é familiar sob a forma de atenção.”

No que diz respeito à escrita automática, esta não se veria livre de “perturbações” do consciente, ou seja, seria impossível a manifestação do inconsciente puro, e os textos, mesmo que tentassem se ver livres de
preocupações histórico-sociais, ainda conteriam reminiscências delas. Como Freud não julgava possível a manifestação pura do inconsciente, e Breton baseia nesta manifestação a idéia central do movimento, elegendo ao mesmo tempo Freud como uma espécie de ”patrono” surrealista, não é de se espantar as divergências que o fundador da psicanálise teve com o fundador do Surrealismo. Porém, esta divergência amplia-se a outros artistas e processos de criação, como veremos a seguir quando abordarmos a questão
de Salvador Dalí e seu método paranóico-crítico.
Quanto ao método de transcrição dos sonhos, utilizado pelos Surrealistas, haveria os problemas da falta de interpretação e da subjetividade, segundo as teorias freudianas. Para Freud, o sonho seria primeiramente dividido em duas partes:
O sonho em si (união do “texto do sonho” com os símbolos), ao qual ele chamou de “Sonho Manifesto”, e o significado do sonho, que ele nomeou de “Pensamentos Oníricos Latentes”. Os sonhos funcionariam como “escape” para desejos reprimidos, sendo que estes desejos seriam os “Pensamentos Oníricos Latentes”, ou seja, o significado de um sonho; porém, este significado seria “censurado” pelo superego (“instância da personalidade que é responsável pela introdução e manutenção dos pensamentos e comportamentos do indivíduo dentro dos padrões socialmente aceitos e princípios morais vigentes, defendendo-o das pulsões instintivas, suscetíveis de criar sentimentos de culpabilidade”), e transformado de maneira a tornar a mensagem aceitável pelo sonhador. Estas transformações causadas pela “censura” seriam resgatadas pela livre-associação e pela interpretação dos símbolos oníricos.

¹- FREUD, Sigmund. Obras Psicológicas Completas; (F) O inconsciente e a Consciência – Realidade. Edição Standard Brasileira Eletrônica. Imago Editora.



Intuição e inspiração nos processos criativos

“O consciente racional nunca se desliga das atividades criadoras; constitui um fator
fundamental de elaboração. Retirar o consciente da criação seria mesmo inadmissível, seria
retirar uma das dimensões humanas.”
“[...] Ainda sob a influência do surrealismo europeu e descrente, talvez em
conseqüência da segunda guerra mundial, da racionalidade no homem, esse movimento
[action-painting] postulava o automatismo do gesto como premissa e princípio de criação. O
gesto automático, involuntário, era tido como ação diretamente oriunda do inconsciente e,
assim excluindo o consciente, devia garantir a autenticidade espontânea da obra. Aliás, a
proposta em si é significativa: ela é impossível; é impossível excluir, voluntariamente, a
vontade.”

OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação / Fayga Ostrower. – Petrópolis, Vozes, 1987. – p.55-56

Revolução Noturna e Revolução Diurna

Revolução Noturna
“Nos primeiros experimentos com a solicitação poética, a escrita automática e a explicação dos sonhos, artigos reais ou imaginários pareciam dotados de uma vida real, própria. Todo objeto era considerado um “ser” perturbador e arbitrário e era creditado como tendo uma existência totalmente independente da atividade do experimentador.”

Revolução Diurna:
“Na segunda fase da experiência surrealista, os experimentadores evidenciaram o desejo de interferir. Esse elemento intencional teve uma tendência cada vez mais acentuada para a verificação concreta e ressaltou as possibilidades de uma crescente relação com o cotidiano.”

Salvador Dalí

Paradoxo surrealista

“Certamente, desde as primeiras conquistas surrealistas deveríamos ter-nos
perguntado se o abandono à imaginação associativa não precisava ser ultrapassado. Alguns
dentre nós, mais tarde, responderam pela afirmativa. O perigo do automatismo é, sem dúvida
alguma, o de muitas vezes associar apenas relações não-essenciais e cujo conteúdo, dizia
Hegel, “não ultrapassa o que está contido nas imagens”. É justo acrescentar, entretanto, que
se na pesquisa filosófica a lei capital é desconfiar da associação das idéias, o mesmo não
ocorre na criação artística, que é, por essência, intuição sensível. O processo das imagens, o
pasmo ou a angústia do encontro abrem uma via rica em metáforas plásticas: um fogo na neve.
Daí sua atração e sua fragilidade: satisfazer-se com excessiva facilidade e afastar-se ao
mesmo tempo do número e do conhecimento tátil do mundo. [...] Por volta de 1930, cinco anos
após a fundação do surrealismo, aparecia em seu seio um flagelo temível: a demagogia do
irracional. [...] Pobre conquista, essa do irracional pelo irracional; triste imaginação, essa que já
não associa senão elementos usados, na verdade, pela morna razão.”

André Masson

Surrealismo e novo mundo

“[O Surrealismo] Não se trata de um simples interesse estético pelos conteúdos do inconsciente, mas da integração de todos os estados mentais num mesmo nível de valor expressivo para contribuir com a criação. [...] Mas o surrealismo não se reduz ao automatismo como muitos crêem. Esse é só um método de exploração que o próprio Breton considerou insuficiente.”

MOLINA, Enrique. Surrealismo Novo Mundo - in PONGE, Robert (org.) Surrealismo e novo mundo. Porto Alegre: Ed. Universidade / UFRGS, 1999. p.25

O surrealismo em Chagall,

“Como em 1922 eu ainda não estava perfeitamente familiarizado com a arte surrealista,
tive a impressão de redescobrir nela o que eu mesmo sentira, de maneira obscura e confusa,
entre os anos de 1908 e 1914. Mas por que, pensei, é necessário proclamar esse suposto
automatismo? Por mais fantástica ou ilógica que a construção de meus quadros possa parecer,
eu ficaria alarmado ao pensar que os havia concebido por meio de uma mistura de
automatismo... Mesmo que por automatismo se tenha conseguido compor alguns quadros bons
ou escrever alguns bons poemas, isso não justifica a sua transformação em método.”

Surrealimo em Sérgio Lima

Tentemos resumir um pouco este conjunto de fatos contraditórios e de vaivéns
históricos, pautados in extenso na cronologia comentada, da seguinte forma: Primeiro – houve
uma aventura ao redor de André Breton, mas não foi ela, na condição de excludente das
outras, a única que constitui a Aventura Surrealista, bem mais próxima da busca mítica do que
parece à primeira vista; vide os argonautas, o ciclo arturiano etc. Segundo – quando Vicente
Aleixandre declara que existe o Surrealismo ligado a Breton e o Surrealismo como um princípio
poético, isso serve, entre outras coisas, para situar dois campos, o da história parisiense e o da
Poesia. [...]”

Theodor W. Adorno. REVENDO O SURREALISMO

"Nos escombros do mundo do surrealismo, o em-si do inconsciente não se revela"




O método e a criação literária: uma visão psicanalítica

Resumo
Neste artigo procura-se destacar, a partir de uma perspectiva freudiana, os aspectos que compõem a funcionalidade da escrita no processo de criação literária, tanto no que se refere à natureza do trabalho secundário de transformação pré-consciente/consciente de que resulta o literário, como no que diz respeito à incidência imprevisível e inevitável dos elementos inconscientes na cena da escrita. Nesse sentido, a autora abre uma discussão a respeito dos elementos em jogo na oposição “método versus criação”, ressaltando as propiciações, limites e impasses no interior dessa dimensão dinâmica.

Escrito por Ana Cecília Carvalho

Link

passagem pelo "Retrato de Dorian Gray"

"A única maneira de libertar-se de uma tentação é entregar-se a ela. Resista, e sua alma adoecerá de desejo das coisas que ela a si mesma se proibiu, com o desejo daquilo que suas leis monstruosas tornaram monstruoso e ilícito."